EGPCE Entrevista: uma conversa sobre Ética e Serviço Público

10 de julho de 2017 - 13:08

De 11 a 25 de julho, estarão abertas as inscrições para o curso Ética e Serviço Público (EaD), ofertado pelo Programa Executivo de Formação em Gestão Pública. Pensando na importância de ampliar o conhecimento relacionado a esse tema que será abordado junto aos servidores participantes do PFGP, a Escola de Gestão Pública do Estado do Ceará conversou com o conteudista do curso, Elvis Rodrigues.

Elvis é mestre em filosofia política pela Universidade Federal do Ceará(UFC), com especialização em Administração Escolar pela Universidade Estadual Vale do Acaraú (UVA) e graduação em licenciatura plena em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Professor efetivo de filosofia da rede estadual do Ceará, atualmente exerce a função de técnico educacional na Secretaria da Educação (SEDUC). Confira a entrevista.

EGPCE: Atualmente, costuma-se dizer que o Brasil enfrenta uma crise que não é apenas econômica, mas também política e ética. Diante disso, qual a relevância de discutir a ética no serviço público?

Elvis Rodrigues: De fato, a crise aprofundou-se de tal modo que já não temos o sentimento de que, mudando os agentes políticos e econômicos, chegaríamos a alguma resolução. O que se exige, na realidade, é uma transformação de conduta, postura e mentalidade. Nisto é que se põe a crise ética e moral, pois é algo que requer uma conversão muito mais de natureza interna (caráter, valores, mentalidade) do que de estrutura. Se fizermos uma memória histórica, para os gregos clássicos, este fenômeno de reivindicaçãopor uma ética na política nem seria tido como questão, pois, para eles, a ética era, essencialmente pública e estava

referida ao comportamento do indivíduo na cidade (pólis). Portanto, ética e política eram vistos como agentes inseparáveis entre si. No entanto, em nossos dias, a corrupção incorporou-se de forma muito grande e grave à cultura de nosso país ao ponto de serem dois momentos, aparentemente, distantes e inconciliáveis. A este respeito, por exemplo, o site Transparency International (www.transparency.org) divulgou no início deste ano que o Brasil ocupa a ingrata posição 79° no índice de Percepção da Corrupção.


A partir deste contexto, nas décadas recentes, vêm adquirindo cada vez mais força o debate e o reclamo por uma ética no âmbito do serviço público. Ou seja, o fomento da ética no serviço público tem a ver com motivar os servidores a obterem melhores resultados na definição dos objetivos e na prestação de serviços, inibindo práticas fora do campo do honesto e do bem comum, a fim de recuperar e dar consistência à confiança cidadã. A Ética Pública, portanto, supõe uma tarefa de serviço aos outros, ao bem comum, e estuda o comportamento dos funcionários públicos em ordem da finalidade do serviço público que lhe é inerente. A importância do trabalho que o servidor público realiza demanda que ele desempenhe suas atividades animado pelos valores e normas morais, espírito de dever voltado ao bem comum, e um claro sentido da dignidade da nobreza que sua função implica.


EGPCE: Sobre a conduta dos agentes da administração pública, quais os princípios fundamentais que a norteiam?

ER: Encontramos na própria Constituição Federal estes princípios norteadores e que são bem divulgados e conhecidos. No entanto, sempre é bom retomar para não nos esquecermos. São eles: Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade e Eficiência. Para além destes, vale citar o célebre “Relatório Nolan”, em que leva o nome do ex primeiro-ministro britânico Lord Nolan. Para ele, os assim chamados “Princípios da Vida Pública” são: Interesse Público, Integridade, Objetividade, Prestação de Contas, Transparência, Honestidade, Liderança. Assim, vemos outra vez a importância dedicada a elementos, em certa medida, do campo do “intangível”, mas que compõem em alto grau de importância os princípios auxiliadores do desempenho ético da vida pública, isto é, valores internalizados – podemos dizer – no caráter e que promovem uma ação prática, real no cotidiano do serviço público.

EGPCE: Essas medidas são suficientes para garantir a efetivação de um serviço público de qualidade?

ER: Por certo que a lei, o ato de vigiar e punir, pode ser um agente inibidor de algum ilícito, mas não é o ideal. Tomemos por exemplo as normas de trânsito. Se o motorista utiliza o cinto de segurança apenas por medo de multa, seguramente em algum momento deixará de usá-lo logo quando não estiver sob o “olhar” do fiscalizador (guardas, radares e assim por diante). Por isso que tanto se fala em educação no trânsito, ou seja, uma compreensão dos direitos e deveres de tal modo compreendido e internalizado, que se faz o que é correto, não por força de lei ou fiscalização, mas pela compreensão de ser o adequado a se fazer. E então, a ética de cheio nesta matéria, pois o agir ético independe de público. Trata-se de fazer o bem e o certo até mesmo no escondido e longe de testemunhas. Portanto, o império da consciência e o desejo de fazer o bem, para si e para os demais, é o terreno por onde a ética assenta seus princípios e pretende validar nas ações cotidianas.

EGPCE: Na sua análise, no que o curso Ética e Serviço Público (e o Programa Executivo de Formação em Gestão Pública) pode contribuir para o comportamento ético por parte dos gestores públicos?

ER: Entendo que um curso como este, bem como toda forma de fomento a uma ética pública e social tende, por si, a colaborar, desde a simples reflexão sobre si mesmo e suas ações, até a mudança de rumo de atitude (se for o caso) ou reforço dos princípios que o indivíduo já realiza e põe em prática. Auxilia a perceber que existe um grande personagem que recebe os resultados de toda ação do servidor e dos gestores público: o outro. Ou seja, tudo que um gestor ou servidor público faz, realiza, assina, determina, decide tem incidência sobre a vida de alguém. Esta preocupação e cuidado com o bem comum precisa sempre conduzir a ação e iluminar o pensamento de quem se dedica ao serviço público, a servir ao público. Senão, corre-se o risco de tratar as próprias ações pela frieza dos números e rigidez da burocracia sem se dar conta de que cada assinatura, cada tomada de decisão recai sobre vidas, histórias e pessoas. Imagino, pois, que o comportamento ético colabora, sobremaneira, na humanização do serviço público e lhe confere maior qualidade.

EGPCE: De que forma essas iniciativas podem impactar positivamente os serviços prestados à sociedade?

ER: Se toda ação de um gestor e servidor público tem impacto sobre a vida de outras pessoas e da sociedade como um todo, podemos dizer que a ação centrada nos princípios éticos de busca do bem comum traz também um impacto, mas de modo positivo sobre aqueles a quem o servidor, em última instância, serve: os cidadãos, a sociedade. Para além disso, e para não parecer algo por demais utópico e abnegado, acredito, também, que tal atitude traz reflexos impactando favoravelmente na própria vida do servidor, ao torná-lo alguém melhor, mais consciente de suas ações, responsável e livre.

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10.07.2017
Escola de Gestão Pública do Estado do Ceará
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